quinta-feira, 29 de julho de 2010

Mestre Pastinha


Vicente Ferreira Pastinha filho de um espanhol, José Senhor Pastinha, e de uma negra baiana, Eugênia Maria de Carvalho nasceu a 5 de abril de 1889, na cidade de Salvador, mulato claro, de estatura mediana, magro, faleceu em 1981 , aos 92 anos de idade. Levou oito anos na Marinha de Guerra, onde foi músico e instrutor de Capoeira. Foi jogador de futebol, chegando a treinar na equipe do Ypiranga, seu time de coração, só não integrando o seu quadro devido a desentendimentos com um de seus diretores. Foi engraxate, vendeu jornais, praticou esgrima, ajudou a construir o Porto de Salvador, foi alfaiate, fez garimpo e também tomou conta de "casa de jogo", ocupando o cargo de "leão-de-chácara", que tinha como incumbência manter a ordem no referido local. Mas tudo isso foi passageiro na vida do mestre; seu desejo era viver de sua arte, pois, além de capoeirista, era pintor e poeta popular. Destaca-se pelo seu belo jogo, seus dotes de filósofo e poeta e seu amor e conhecimento dos fundamentos da Capoeira Angola. Representou o Brasil no I Festival de Arte Negra, em Dakar. Pastinha inicia-se na Capoeira por intermédio de um negro de Angola chamado Benedito. Eis a sua história: "Quando eu tinha dez anos de idade, eu era franzininho. Um outro menino, mais taludo que eu, tornou-se meu rival. Era só eu sair para a rua, fazer compras , por exemplo, e a gente se pegava em briga. Só sei que acabava apanhando sempre. Contava ainda o menino com o apoio de sua mãe, que o incentivava a bater mais. Ao voltar para casa, eu ainda apanhava pela segunda vez, de minha madrinha, por causa da demora de trazer as compras ou por estar com a roupa rasgada. Então eu ia chorar de vergonha e tristeza. Um dia, da janela de sua casa, um velho africano assistiu à briga da gente. 'Vem cá meu filho', ele me disse, vendo que eu chorava de raiva depois de apanhar. 'Você não pode com ele, sabe, porque ele é maior e tem mais idade. O tempo que você perde empinando arraia vem aqui no meu cazuá que vou lhe ensinar coisa de muito valia.' Foi isso que o velho me disse e eu fui. Ele arrastava os móveis da sala e deixava um espaço livre onde me ensinava a jogar Capoeira, todo dia um pouco e aprendi tudo. Ele costumava dizer: 'Não provoque, menino. Vai botando devagarzinho ele sabedor do que você sabe.' Um ano depois, encontrei o menino na rua. Ele então me perguntou: 'Estava viajando ou estava se escondendo com medo de mim ?' Eu então lhe respondi: 'Estava com medo!' A mãe do menino já se encontrava na porta, sorrindo, divertida, esperando o início do espetáculo, quando seu filho venceria novamente a batalha. Mas, para sua surpresa, aconteceu o contrário. Assim que o menino levantou a mão para desferir a pancada, com um só golpe, mostrei-lhe do que eu era capaz. E acabou-se meu rival. O menino ficou até meu amigo, de admiração e respeito. O velho africano chamava-se Benedito." Mestre Pastinha defrontou-se com o perigoso capoeirista Pedro Porreta, que marcou época na Bahia pela sua maneira agressiva de proceder e pelas inúmeras desordens que praticava, chegando a enfrentar o famoso chefe do Esquadrão da Cavalaria, Pedro Azevedo Gordilho, mais conhecido como "Pedrito". Eis a história da luta: "Tudo começou quando Pedro Porreta foi morar em um barraco perto da Rua das Laranjeiras, onde o Mestre Pastinha possuía uma quitanda. O Mestre Pastinha tinha ido à feira buscar bananas. Deixou sua mulher tomando conta da quitanda quando entrou Pedro Porreta, que não sabia que a mesma pertencia ao Mestre. Ao entrar, pediu meia dúzia de bananas. 'Não temos, o meu marido foi buscar ainda agora, na feira', respondeu-lhe a mulher do Mestre. Pedro Porreta já ia saindo quando avistou quatro bananas em cima do balcão. Virou-se e indagou: 'E estas quatro bananas que estão aí, para quem são?' 'São para os bichinhos!', disse a mulher do Mestre, apontando para uma gaiola com dois pássaros. Pedro Porreta avançou, pegou as bananas e saiu dizendo: 'Os bichinhos sou eu!' Ao voltar da feira, assim que entrou na quitanda e estava colocando o pesado cesto de bananas no chão, sua mulher foi lhe contando o sucedido. Ao terminar de ouvir o relato, o mestre saiu imediatamente à procura do desconhecido. Ao chegar à rua, encontrou um amigo seu, que a tudo assistira, revelando a identidade e o endereço do indivíduo. O Mestre agradeceu e dirigiu-se à casa de Pedro Porreta encontrando-o na porta. Pedro Porreta, não suspeitando de que ele fosse o dono da quitanda, cumprimentou-o amistosamente: 'Como vai Mestre? O que deseja?' Ao saber que ele era proprietário da quitanda e vinha disposto a obter uma explicação pelo que acontecera, abriu a porta, soltou uma gargalhada e apontou para as bananas que estavam dentro de uma panela cozinhando. Pastinha, notando a expressão zombeteira de Pedro Porreta, virou-se para ele e disse: 'Pedro, eu vou levar as bananas assim mesmo, só por causa do seu desaforo de invadir minha quitanda sem a minha presença e zombar da minha mulher.' Ao ouvir isto, Pedro Porreta dirigiu-se ao meio da rua e desafiou-o para lutar. Mestre Pastinha aceitou o desafio e a briga prolongou-se por vários minutos, sem que ninguém tivesse a coragem de apartá-los, só terminando com uma violenta cabeçada do Mestre Pastinha, atirando-o longe, estendido junto ao passeio. Neste momento, aproximou-se um senhor que morava nas proximidades e, depois de inteirar-se do motivo da briga, prontificou-se a pagar a despesa, contanto que encerrassem aquele assunto. O Mestre Pastinha não aceitou o dinheiro do tal senhor, dizendo-lhe: 'Meu amigo, eu agradeço a sua gentileza, mas o que motivou a minha briga com o Pedro não foi o dinheiro da despesa com as quatro bananas, e sim, a maneira como ele procedeu.' Dizendo isto, retirou-se para a sua quitanda e Pedro Porreta mudou-se de seu barraco, no dia seguinte." Mestre Pastinha e Velocidade:"Certo dia, no ano de 1935, estando o Mestre Pastinha a jogar Capoeira na Rua do Bigode, onde funcionou a sua segunda Escola de Capoeira, com um capoeirista conhecido por Velocidade, tal era a sua rapidez nos movimentos da Capoeira, recebeu um golpe tão violento no rosto que o fez dormir em pé durante alguns segundos. Quando recuperou os sentidos, pensou que se tratasse de uma pedrada partida da assistência. Estava ainda a olhar para os lados para ver se localizava o causador da pancada, quando Velocidade se aproximou-se e disse-lhe: 'Desculpe Pastinha!' Só aí ele percebeu que não fora pedrada e, sim, um golpe desferido pelo seu camarada. Virou-se então para ele e falou: 'Menino, eu brincando sem maldade e você me aplica um golpe com toda esta violência.' Acabando de dizer estas palavras, tornou a dormir por mais alguns segundos. Quando se recuperou totalmente, dirigiu-se à bateria e ordenou que continuassem o jogo interrompido. Prosseguiu então o jogo com o entusiasmo dos assistentes que esperavam e desejavam que o Mestre aplicasse uma surra no seu desleal camarada que numa brincadeira entre amigos fizera aquela desfeita com o Mestre e o público ali presente. A certa altura do jogo, o Mestre, com um floreio, deixou seu adversário à sua mercê, com o pé parado junto ao seu rosto, mostrando a todos os presentes e ao próprio Velocidade a sua superioridade. Ainda assim, os assistentes se revoltaram com o Mestre Pastinha por ele não ter chutado o rosto do seu camarada. Depois de terminada a 'brincadeira' Mestre Pastinha calmamente dirigiu a palavra aos presentes: 'Se eu fizesse o que desejavam vocês agora seriam os primeiros a me condenar, alegando a minha condição de Mestre.' Todos concordaram com o que foi dito e o Mestre Pastinha ficou ainda mais admirado e respeitado no local."

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